O mês de Outubro os excitava
Exibiam-se vorazes,
girando ao redor do fogo que os incendiava.
A dança do acasalamento não cessaria até que
A dança do acasalamento não cessaria até que
vencidos pelo desejo
copulassem.
copulassem.
Cientes da instintiva ação depois do ato,
movimentar-se-iam com cuidado,
adiando ao máximo o orgasmo um do outro.
Apesar do medo, era irresistível.
A nudez constrangida pelo sol escaldante
foi um convite irrecusável e,
ali mesmo,
aos olhos do sol,
fervilharam os hormônios.
Precoces como o instinto manda,
porém próximos demais.
Precoces como o instinto manda,
porém próximos demais.
(Nina)
A satisfação lhes reduziu a tolerância
A satisfação lhes reduziu a tolerância
a natureza assassina tomou seu lugar.
O círculo da condescendência se desfez,
feromônios não perfumavam mais.
Súbito e preciso o instinto gritou:
“Defenda-se escorpião!”
Ergueu-se do coito
antes que ela o decepasse,
no peito dela
seu ferrão cravou.
O sangue que escorreu,
ao genoma "meia volta" ordenou.
Volveu um soldado
para no efêmero buscar o que perdura.
E novamente à procura
de sexo e morte partiu.
(Marte)
.
Imune ao veneno inoculado, não se deu por vencida.
Curvada pela dor da fisgada repentina,
lambeu da fenda aberta o sangue Frio que esvaía.
Escorria-lhe por dentro o ódio e,
por entre as pernas,
o desejo de tê-lo inteiro entre elas.
Aquele ataque surpresa seria vingado
Aquele ataque surpresa seria vingado
da maneira mais dolorosa possível.
Ativando seu arsenal sensitivo,
elaborou com requinte cada um dos passos seguintes.
Esgueirar-se-ia até encontrá-lo.
Esgueirar-se-ia até encontrá-lo.
Acima das quelíceras,
a boca úmida ansiava por sangue, horror e êxtase.
(Nina)
.
Escorpião distraído!
Seu par não se mata com veneno,
Seu par não se mata com veneno,
toxina lenta e corrosiva.
Apunhala-se no peito.
com um só golpe
Apunhala-se no peito.
com um só golpe
decisivo e certeiro...
Ao negar a clareza,
da obsessão se fez presa.
Condenou-se a busca vã,
eterna, incessante,
solitária, distante e pagã.
Insubstancial verdade, que assombra à beça,
nem notou que já cheira a sangue.
Não dos predadores quentes,
mas dos necrófagos vermes.
Arrastando seu telson, antes soberbo,
agarrado a pútrida pinça restante, ainda recusa o jazigo.
Arrastando seu telson, antes soberbo,
agarrado a pútrida pinça restante, ainda recusa o jazigo.
Segue em marcha querendo vingança.
Certo da morte.
Certo da paz.
Certo de que a amada de si se aparta.
(Marte)
.
Susceptível à fúria cega, de fogo líquido ela se encheu.
Seus instintos famintos já o cheiravam.
Somente a morte dele a salvaria.
O abscesso aberto,
O abscesso aberto,
seria com maestria vingado.
O sangue coagulado a mantinha prisioneira
da ferroada sexual inesperada e seca.
Durante o gozo sibilante dele,
ela o prenderia em seu sexo e,
com uma das pinças, decepar-lhe-ia a vida.
Uma sensação libidinosa antecipada a assanhava.
O prazer macabro do ritual garantir-lhe-ia a mais cruel das glórias.
Seus opérculos genitais sedentos já ardiam febris.
Mesmo sob efeito do veneno, inoculado covardemente em seu peito,
Mesmo sob efeito do veneno, inoculado covardemente em seu peito,
ela já gozava com o premeditado.
A imaginação, se sobrepunha à carapaça ostensiva.
Sob a couraça, a fria natureza assassina a mantinha aquecida.
A imaginação, se sobrepunha à carapaça ostensiva.
Sob a couraça, a fria natureza assassina a mantinha aquecida.
(Nina)
.
Andava sem rumo.
Dera-lhe as costas há.muito.
Insistia-lhe o medo. Maya.
O fantasma que o espreitava.
Maya,
o veneno dele e dela.
Maya, a Fúria detenta, o sorriso infantil,
o sexo promíscuo,
castidade servil.
Tudo neles era “aquilo que não é”.
Ao ouvir a música do embate,
Ao ouvir a música do embate,
fumou um cigarro, como tantos antes.
Soldado, guerreiro sem vitória,
Soldado, guerreiro sem vitória,
olhou por sobre os ombros e lá estava "aquilo que não é”,
em sangue e cólera
em sangue e cólera
a persegui-lo.
( Marte )
.
A trajetória exaustiva até ele
transformara a fúria em um amor cheio de ódio.
A morte tão desejada se fez vulto.
Uma aura dramática imprevista a envolveu.
De joelhos sobre o que sentia,
A morte tão desejada se fez vulto.
Uma aura dramática imprevista a envolveu.
De joelhos sobre o que sentia,
rasgou o próprio peito
com um golpe duro e definitivo.
Incapaz de suportar a grandiosidade do gesto,
a tirania chorou pelo instante oferecido.
O acurado instinto de sobrevivência
num ímpeto de amor e fúria tomou-a em seus braços,
O acurado instinto de sobrevivência
num ímpeto de amor e fúria tomou-a em seus braços,
sorvendo-lhe a intensa paixão prometida
e toda sua adorável natureza inflexível.
A morte dela era vida.
(Nina)
.
Perplexo, o escorpião desculpou-se pela vida
e por todas as coisas
cujo controle não mais detinha.
Ao corpo mutilado cantou canções,
todas que aprenderam a chamar de "nossas"
e da vingança se redimiu.
Do sangue intenso que do amor jorrava,
Do sangue intenso que do amor jorrava,
viu brotar pétalas rubras.
Em lágrimas, a elas levou seus lábios
e seu último e desnecessário juramento proferiu:
e seu último e desnecessário juramento proferiu:
“Deixo-te em paz meu amor!"
(Marte)