quinta-feira, junho 14, 2007

Êxtase


Sobe
Sobe às alturas
Deixe que se estenda em linha
A sequência vital confusa
Que não se abala
Mas leva
Leva o branco líquido
Que da tua teia de nervos
Após um sim coagido
Jorra

Jorra pelas úmidas bordas
Ao redor deste cansaço que pulsa
Pulsa
Entrelaçando as horas

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Nina Delfim

quarta-feira, junho 13, 2007

O Beijo


Quarta-feira. Cinzas até a borda do cinzeiro. Luto.
Na poltrona, o gato. No chão, os cacos. Há no ar uma ardência vermelha que queima. A parede sustenta a desastrosa tentativa de repetir o beijo de Klimt. A moldura, em péssimo estado, enquadra a cena. Em foco estão a ruiva, o homem e uma colcha de hieróglifos. Coxas quentes. O estanho incandescente entranhando o dourado fomenta o holocausto de prazeres praticados sob o tecido. Interseção de fibras. Camadas espessas de tinta ocultam o fundo. Escuro. A visão foge à horizontalidade. Independente do ângulo, todos os elementos convergem suntuosos para o centro. São amantes. Dejetos de luas e estrelas preenchendo o branco de uma sala de cinqüenta metros quadrados. Olhares confessos resguardam as pálpebras fechadas de ambos. Vagos deLírios perfuram a postura preguiçosa dos corpos pousados sobre a tela. Uma atmosfera orgástica flutua por todo o ambiente. O dourado se espalha iluminando o ato. Absortos estão o gato e os dois corpos em conluio. Lá fora, os gerânios debruçados sobre a floreira, aguardam pelo amarelo de Van Gogh. Desmaia finalmente o azul cansado à oeste. Noite. Aciono o timer. A luz a mais entranha a mente. Circunda-me o princípio do óbvio. Não decifro a colcha, mas sei que um Uni-verso paralelo acoberta a razão daquele beijo.
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Nina Delfim

terça-feira, junho 12, 2007

Translação


Finalmente ele fez um movimento. Ancorado à velha poltrona, fechou os olhos e afundou no acaso da ambigüidade que o vinculava à metáfora. Apesar do quase incontrolável desejo de lambê-la até os ossos, encolheu-se. Partículas muito finas encobriam os postulados à bordo de sua mente. Era visível o firme propósito de tê-la presa às costas. Conhecia bem os entremeios das palavras e soube que exatas cem gramas de poesia seriam suficientes àquele coito literário. Mas tão logo o mar por detrás dos olhos o engoliu do cenário, abriu os braços e mergulhou em busca do homem que trazia dentro.
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Nina Delfim

segunda-feira, junho 11, 2007

E aí, Jean-Paul Sartre?


Sr. Sartre, esta manhã fui acometida por Nauseas. Constatei os dois mundos que me abraçam. Enojada me reconheço diante às crenças e teorias que acumulei ao longo destes anos. Convicções me atormentam. Uma Melancolia insiste em me maltratar. Situo-me entre a intensidade desta luz que brilha tanto e na mais profunda escuridão dos pensamentos. Apesar dos esforços, não estou encontrando razões para ultrapassar O muro que ergui, este que me separa de mim. Enclausurei-me em meus próprios métodos. O que faço? Me diz!
Nascem e morrem em mim os meus pensamentos. É minha esta noção de mim?

Corrói-me o resultado do valor que me atribuí durante o enfadonho existir. Nesta situação-limite me oprimem as virtudes, que cobram fidelidade canina ao meu Ser. Minha consciência se transformou em um invasor de sangue-frio e tem me ocasionado conflitos.
Doem-me estes horrores de mim.
Sr. Sartre, o que faço com esta versão existencialista?
Assimilei o desgosto pela humanidade que tanto assolou a mente de Søren Aabye Kierkegaard. Seria o meu inferno mais quente que o dele? Estas chamas que me incineram serão cicatrizadas pelo meu espaço-tempo?
Na lenda da realidade, trafego entre O Ser e o Nada, completamente desorientada e trago As mãos sujas, manchadas pelas atrocidades que cometo diariamente contra este meu estar em-si.
Seria a minha vida uma mera Questão de Método? Devo alterá-los?
O esboço mal confeccionado ao exibir emoções acumuladas me influenciam em demasia. Seriam também seus, estes meus tormentos? Em que canto deste inferno a resposta às minhas indagações se escondeu? Em mim mesma? São quatro os cantos a me abreviar os encantos para vivenciar este inútil auto-conhecimento?
De tudo que eu nunca quis saber, sei excessivamente. Do que pensava saber, nada mais sei.
Sr. Sartre, estou Entre quatro paredes?
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Nina Delfim