domingo, outubro 01, 2006

A rima


Criou-se a si própria
para a alegria dos homens
Bem-aventurados os escolhidos
para prevaricar com ela
Aos habituados à pressa
eu aconselho cautela
Guarde-a na boca
bem embaixo da língua
como um último desejo a ser saboreado
Sedenta
ela vai como o pólen no vento
leve
leviana
espalha-se
fecundando tudo
Não deixe que se perca
perdida se torna vulgar
entrega-se sem qualquer sentimento
Não tente saciá-la
Não se atreva a domá-la
receba-a simplesmente
deixe que venha
assim
como um beijo
No primeiro contato
seja discreto
controle o suor e o desejo
não demonstre excitação
insinue-se apenas
Fique atento ao compasso
ao menor sinal de descuido
acabará aprisionado no tempo comum
que só ela domina
Proteja-se dela
em caso de tormento
não demonstre aflição
através da insegurança ela te invade
alienando idéias
comprometendo o efeito da ação
Nem pense em decifrá-la
ela é cheia de artimanhas
adora delírios e lágrimas
Defenda-se e não se renda
Por fora é obscena
Por dentro ela é suntuosa
comunga recursos sedutores com sintonia perfeita
Cuidado
mantenha distância segura
proximidade exagerada
danifica a razão ocasionando o vício
Possuído por ela
não vai lhe sobrar nada
e sem criatividade
não poderá conquistá-la
Vista de longe parece comum
frívola e circunstancial
mas não se deixe enganar
duvide desta doce aparência
ela é sútil por isto é perigosa
Aproxime-se lentamente
evite tocá-la de impreviso
ela é avessa ao toque não consentido
se faz dura e quase sólida
interferindo em tudo
até mesmo no ritmo da fala
Conserve a paciência
penetrá-la à força
é agir contra o tempo cadenciado
ela tem seu próprio movimento
Seduzida ela inspira
exibe-se exclusiva
mostra-se bela e se faz rara
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Nina Delfim

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